FELICITAÇÕES A UM AMOR ANTIGO

14/08/2013 04:32

 

 

 

Por Alanna Souto

No meio de emaranhado de coisas a fazer, frustrações, decepções, lágrimas e sorrisos, prazeres, desafios constantes, metas e lutas. A caminhada incansável do ordenar da vida, entre o estar, o ter e o ser, não parava de pensar naquele ser que havia encontrado fazia algumas semanas, deu de ombros, foi embora, cambaleando, perdida entre braços grosseiros e companhias descartáveis.

Já havia passado alguns anos que essa paixão tinha adormecido, entre amantes efêmeros, amores surreais e “coitos interrompidos”, podia parecer estranho devido o tempo ou pelo comportamento que foi de quem a relembrava, mas aquela paixão despertara, e sem saber o que dizer, a não ser a vontade louca de encontrá-la e beijá-la, dantes de toques, e esfregar dos corpos, queria apenas sentir o sabor de seus lábios, abraçá-la, sentir sua respiração e as batidas aceleradas do coração no silêncio ressonante do toque da trombeta do querubim que os abençoara desde dia em que se conheceram. Seria loucura, dizer que a amava? O amor não seria toda forma de sentir que resiste ao tempo e seus processos? De Afrodite á Atena diziam, o amor é atemporal.

Depois do primeiro contato após o despertar a tal paixão se fechara como uma concha, protegendo cada pétala de sua flor de se machucar novamente, reservara-se mais ainda, como se cada novelo daquela lava estacionara em seu processo de transformação, talvez o medo do desabrochar em terras de recintos “familiares”, talvez a borboleta só voe revelando cada tonalidade de suas cores em terras errantes, talvez seja tudo isso ou simplesmente a indiferença tomando lugar do amor ou da dor.

No determinado momento da noite, essa reles pensadora da vida, que fazia da conexão com onisciente o seu exercício maior e mais precioso, sobrevivendo cada batalha que travava com o cotidiano, entre seres humanos que passavam o dia a disputar opiniões e acariciar seus egos, a emitir desejos negativos uns para outros trasvestidos de “companheirismo”, afastara-se mais uma vez de todos e já não se importava com aquele clã de vaidades que se regozijavam em redes e camas sociais, cada um com suas máscaras. Felizmente ou não, não estava com o traje adequado e nem com a máscara apropriada, talvez aquela de intelectual comunista pudesse ser bem utilizada, parece que era uma das mais usadas numa das alas das imagens, mas sem essência, perde a graça... Há tempos se recusara participar desses bailes e de seus blocos á fantasia, salvo raras exceções.

Resolveu então meditar sobre o mito de amor e daquele ser que despertara novamente do sepulcro de suas emoções. Lembrou-se de Sartre e Simone de Beavoir, do amor essencial e dos amores contingentes, pulou essa, na intimidade foi mais dor do que amor, apesar da verdadeira amizade e cumplicidade. E Beavoir antes de morrer, Sartre já falecido, assumiu frustrada, o preço alto por ter feito da liberdade afetiva a renúncia de ter vivenciado um amor pleno seja com Sartre ou com sua grande paixão Nelson Algren. Esse chegou afirmar, dizem as más ou boas línguas, depois do rompimento de seu caso com Beauvoir: quem vive de amores contingentes tem uma vida contingente.

Uma coisa é certa, o amor só dura em liberdade, sim, mas acima de tudo o amor exige exclusividade e até certo ponto renúncia, talvez esses dois grandes filósofos do século passado perderam-se em suas mentes geniais buscando racionalizar demais aquilo que jamais pode ser contido em sinapses : o sentir. Isso vem de outro lugar, é divino maravilhoso e misterioso.

 Ou então se pode considerar como o doutor Abrenuncio aquele personagem ateu criado pelo épico Gabriel Garcia Marques em Do amor e outros demônios tivesse razão o amor era um sentimento contra natureza, que condenava dois desconhecidos a uma dependência mesquinha e malsã, tanto mais efêmera quanto mais intensa. Correto ou não, o caso que todos admiram uma paixão vivida com coragem e euforia, até mesmo seres como o doutor cético dessa obra que não escondia admiração que lhe causava o homem, como Cayetano Delaura, que havia se libertado das servidões da razão e/ou de religiosidades mortíferas que condenam a felicidade e a ousadia, sem dúvida alguma D`us deve levar muita mais consideração o Amor do que a fé cega pautada em desígnios divinos distorcidos pelo fanatismo humano.

O que fazia então aquele comum ser pensante revisitar filosofias sobre o amor enquanto aquela paixão que despertara estava a borboletear em planícies Del mar, talvez ele buscasse ousar na subversão das emoções como Goethe que vivia o amor como a forma mais radical de chegar ao outro. E indo mais fundo na construção desse amor subversivo “goetheano” como foi Leandro Konder em Sobre amor, para além do autoconhecimento socrático, amar é viver intensamente a aventura de sair de si mesmo e mergulhar na alteridade.

Talvez fosse esse ponto quisesse chegar no auto mergulho de si e do outro com todo seu equipamento necessário para mergulhar no universo de indiferenças e idiossincrasias daquela borboleta errante que fazia tanto esforço em ocultar sua essência em seu casulo ao visitar águas doces Del rio de Osun. Mas para isso precisava não só da licença, mas da permissão para mergulhar nessa maré de sentimentos sincrônicos e diacrônicos. Afinal, tudo tem seu ‘dono’, nem que seja si mesma.

Talvez o convite nunca acontecesse. Talvez essa cabeça pensante, da poética, da filosófia diásporica e das ciências nem esperasse mais por qualquer [re] encontro, ou mesmo só buscasse transmitir boas vibrações e felicitações em cada alçar vôo da vida daquele ser que se [re]partira . E que sim merece voar sem tantos pesos, angústias e fardos. 

Sim, a aquela borboleta e todas as borboletas amadas mereciam voar sem bagagens poluídas, sem reprimendas, com sua leveza e delicadeza habitual do seu estado natural, deixando fluir sua linda essência colorida, livre e transparente. 

Resolvera então apenas guardá-la no escrutínio do seu coração até quem sabe reabri-lo com o florescer de algum girassol ou rosa que reinasse imponente em seu jardim e assim esvaí-lo de vez, afinal a vida continua, e esta pensadora é o fazedor, a jardineira fiel que vive aparar as arestas do plantio, vigilante no combate das ervas daninhas e por dever generoso em tempos de colheita.

Ou quem sabe tudo isso não passara de uma lembrança fortuita de um amor clandestino dos paradoxais anos de 1960, que apesar de toda a efervescência de seus encontros e desencontros, revoluções, alucinações e queimas de sutiãs, foram, acima de tudo, tempos de crises morais...tempos ápices de guerra fria.

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