O SERVIR NA UMBANDA: TOLERÂNCIA, INCLUSÃO E LIBERDADE.

24/11/2012 10:26

    O texto de hoje trata-se de uma reflexão pessoal do meu processo de aprendizado [bem como de leituras e pesquisas pessoais] de quase sete anos como praticante, médium e militante de uma tenda de umbanda a qual fiz parte bem recentemente, que se diga de passagem sou muito grata e reservo muito respeito no sentido de reconhecer os grandes, nobres e dignos acertos presenciados. Tal período, importante registrar, é muitíssimo pouco tempo diante de todo milênio de sabedoria e hermetismo que perpassa a arte dos mistérios divinos da Lei divina em ação, aliás, todo tempo na “terra” no exercício desse  religare é pouco perante o infinito e imensurável Governo Oculto do Mundo. 

    Abro um parêntese rapidamente para dizer que nem toda iniciação num determinado templo significa que o neófito tenha que completar seus “ensinamentos” até os últimos dias de sua vida na mesma “escola iniciática”, especialmente, porque a vida é cheia de imprevistos [provações] e tudo perpassa humano, desde o discípulo até o dirigente da casa, são todos humanos, até mesmo a comunicação mediúnica com o divino depende do equilíbrio humano, se não claramente ou sutilmente, de acordo com o estado de [des]equilíbrio mediúnico, refletirá, obviamente, o que é conveniente à situação do “aparelho” [médium], sobretudo, se ele se diz ser o  “porta da voz mor” de imensa luz, nesse caso tal estado  pode o levar até mesmo ao “abuso do poder”, quando se utiliza de um guia para afugentar pessoas que desagrade ou tenha desagradado o “porta voz”, nesse caso, surgem as seguintes indagações, um guia de luz condena ou cerceia seres humanos de adentrar num templo por problemas pessoais humanos, sem ouvi-los ? Um guia destrata seres humanos por questões [pseudos] morais terrenas, jogando todos na fogueira, de acordo com “juízo” de valor do “aparelho”? As respostas para essas perguntas encontram-se em vossos corações, e, certamente responderão NÃO, os guias trabalham com a compreensão divina, mesmo os Executores – Os Exus de lei e bombosgiras  não agem dessa forma, são seres onipresentes e por mais equivocadas ou corretas que sejam as ações humanas, eles certamente lhes ouvirão, independente de qualquer coisa...Então se percebe que a qualquer momento o ser humano estar a beira de  um ataque de nervos  por mais elevado em que se diz ser, até São  Franscisco de Assis já teve seus momentos de destemperos quando tentaram desvirtuar os fundamentos de sua ordem, ainda mais nós reles mortais, justamente, em função das famosas provas de expiações a qual poderá culminar num fortalecimento da união, se for o caso da sábia, justa e humilde ponderação de tais indivíduos, há pesar para aquele que se diz mais sábio e experiente ou então o rompimento dos laços pela mesma causa ou inverso-negativo da causa, tudo rumando a libertação. A pergunta que fica é: a “queda” foi de quem? Cada um tem seu ego manipulativo, ainda mais quando a imagem “moral” está em jogo, mas é a consciência que irá pesar ou não na hora do deitar da cama. Já diria a canção “cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é...” e sobre veracidade há aquele sábio dito popular, “existe a minha verdade, existe a sua verdade e existe A VERDADE, a verdade divina”!... A verdade é o que nos faz livres. “Conheceis a Verdade e a Verdade vos libertará”, disse O PAI.

    Fecho parêntese retomando para o serviço na umbanda alicerçado no amor e caridade ao próximo, no culto a natureza e aos seres vivos, nada se cobra materialmente e nada se imola, digo a umbanda nascente em 1908 na cidade de Niterói-RJ anunciada pelo caboclo das Sete Encruzilhadas, aquela que deu a voz ao povo por meio de sua tríade sagrada, “Caboclos, Pretos velhos e erês” e, acima de tudo, dignifica a vida cultuando todo ser vivo sem sacrifícios.

    Ainda, nessa época, foram estabelecidos os princípios básicos que nortearam e norteiam todos os templos da Umbanda Genuína que seguiram a doutrina pregada espiritualmente em solos terrenos desde 1908, portanto, sendo assim um registro histórico, sociológico e antropológico de uma religião de matriz universal, pois se organiza a partir de diversos matizes culturais e espirituais [catolicismos, kardecismos, esoterismo, xamanismo indígena, culto aos orixás de matriz afro, dentre outros] que não pode ser ignorado por nenhum praticante e/ou estudioso, pois  nessa raiz universal se encontra o  viés de formação da umbanda e suas normas gerais, independente das diversas formas que se executa a Umbanda, afinal, cada terreiro é uma “tribo” e possui seu “cacique” que direciona o trabalho, as vertentes e a filosofia do seu templo, de acordo com suas instruções comunicativas com o divino.

    Nesse sentido podemos constatar que a Umbanda é uma religião livre, cujos conceitos são passados oralmente, de geração a geração, dessa forma, a sua ritualística e fundamentação é adaptada a cada pensamento que forma uma vertente dentro da religião. Diante de determinado tema existem diversas interpretações, dessa forma deve-se ter a cautela ao selecionar o que melhor lhe convier, contudo aqui elenco alguns princípios gerais dentre tantos que perpassam a maioria dos templos [terreiros ou tendas] alicerçados na Umbanda tradicional fundada por Zélio Fernando de Moraes, tais conceitos já bastante conhecidos e debatidos por autores, especialistas na temática, a citar WWW. Da Matta e Silva, Rubens Sareceni e mais recentemente Lurdes Vieira, todos, além de estudiosos, mestre iniciados, sacerdotes da lei divina em ação. Segue:

1) A existência de um Princípio Criador – DEUS, O Onipotente e Irrepresentável; chamado Zambi. Algumas das entidades, quando incorporadas, podem nomeá-lo de outra forma, por exemplo, Tupã para caboclos, entre outros, mas são todos fiéis a um só Deus;

2) A manifestação trina do Princípio Criador, dentro da visão Naturalista e Espiritualista;  

3) A Crença nos Orixás dos cultos Afro-Brasileiros e nas Linhas da Umbanda; 

4) A existência de entidades espirituais, mensageiros das vibrações dos Orixás, ainda em evolução, diga-se de passagem, um outro tipo de evolução de outras esferas dimensionais, bem diferente do processo evolutivo humano ; a manifestação dos Guias para exercer o trabalho espiritual incorporado em seus médiuns ou "aparelhos", também chamados de "cavalos";

5) A Reencarnação e a Lei do Carma;

6) O regaste interno, a “raça” caída [crença atlantiana],sempre em busca do aperfeiçoamento evolutivo humano,  cura e a libertação por meio da iniciação magística.

7) A prática da mediunidade em suas diversas manifestações;

8) O Amor, manifestado como Caridade, na palavra e na ação; A obediência aos ensinamentos básicos dos valores humanos, como: fraternidade, caridade e respeito ao próximo. Sendo a caridade uma máxima encontrada em todas as manifestações existentes;

9) A afirmação de que o ser humano VIVE NUM Campo Vibratório, sendo Ele próprio um Campo Vibratório que o seu Livre Arbítrio comanda, dentro do princípio da natureza trina: Espírito, Alma e Corpo;

10)  Uma doutrina, uma regra, uma conduta moral e espiritual que é seguida em cada casa de forma variada e diferenciada, mas que existe para nortear os trabalhos de cada terreiro;

11) A Umbanda está a serviço da Lei Divina e só visa ao bem. Qualquer ação que não respeite o livre-arbítrio das criaturas, que implique em malefício ou prejuízo de alguém ou se utilize de magia negativa, não é umbanda; 

12) A Umbanda não realiza em qualquer hipótese o sacrifício ritualístico de animais nem utiliza quaisquer elementos destes ritos em oferendas, ou trabalhos; 

13) Reverencia às forças da natureza, a preservação e o respeito a todos os seres vivos e ambientes naturais da Terra; 

14) Todo serviço da Umbanda é de caridade, jamais cobrando monetariamente ou aceitando retribuição de qualquer espécie por atendimentos, consultas ou trabalhos;

15) A Umbanda possui identidade própria e não se confunde com outras religiões ou cultos, embora a todos respeite fraternalmente, partilhando alguns princípios com muitos deles;

 

    Finalizo a reflexão frisando a importância da prática do último princípio, assim como todos, mas, sobretudo, pelo exercício diário do RESPEITO E TOLERÂNCIA a qualquer outro culto religioso culmina na importante luta pela liberdade religiosa que também perpassa o servir na umbanda, fundamental para o reconhecimento da FRATERNIDADE, SOLIDARIEDADE E COMPREENSÃO para todos aqueles que são perseguidos historicamente por não seguirem religiões eurocêntricas consideradas oficiais, apesar de vivemos em um Estado laico desde 1924. Bravos e verdadeiros militantes do movimento afro-religioso e umbandista, a eles devemos ser grato pelo avanço e conquista de muitos direitos conquistados, a citar a legalização dos terreiros em muitos estados, inclusive, em Belém do Pará se destaca como uma das cidades que muito contribuiu nessa conquista e a tão importante lei 12.644 que decreta o dia 15 de novembro, como dia nacional da Umbanda. Portanto, umbandista que ataca seja pessoalmente ou em redes sociais ou em eventos acadêmicos práticas afro- religiosas de forma generalizante e superficial, simplesmente por não seguirem a “Verdade absoluta” empregada pelo seu templo vai à contramão do viés dos princípios básicos da própria UMBANDA SAGRADA, tornando-se um ser, seja ele adepto, médium de uma corrente ou mesmo um sacerdote, o que é mais grave, AUTORITÁRIO E INTOLERANTE, além de jactancioso por ser considerar o único detentor do CAMINHO SAGRADO, o que é uma contradição, pois a tríade da umbanda está pautada na obediência, lealdade e HUMILDADE!

    Vamos companheiros regar a nossa flor divina, a qual sua força vital vem do exercício diário da humildade e tolerância para que ela não SEQUE, para que, sim, FLORESÇA, perdure por muito tempo e assim façamos um trabalho de caridade na prática do bem seja em que templo for, seja afro-religioso ou de umbanda, busquemos, de fato, a nossa cura interna e externa GENUÍNA e LIBERTADORA de nossas próprias amarras morais e egóicas [vaidade, orgulho, recalques, etc.], façamos do discurso à prática, da coerência o respeito, da tolerância e autocrítica à humildade.  Sigamos em paz, combatendo a intolerância e toda forma de preconceito, mesmo quando surgem dentro da nossa própria seara religiosa, pois como diria Cristo Jesus “Filhinhos, não amemos de palavra nem de boca, mas em ação e em verdade. '' I João 3.18".

Saravá!

Alanna Souto

24 de novembro de 2012.

Tópico: O SERVIR NA UMBANDA: TOLERÂNCIA, INCLUSÃO E LIBERDADE.

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